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David Capistrano Filho
Alcalde de la ciudad de Santos-Estado de Sao Paulo
Versión en castellano: El poder local y la vivienda popular.
A história do poder local no Brasil remonta às raízes ibéricas da
colonização de nosso país e ao longo de quase cinco séculos a
autonomia das instâncias locais conheceu fluxos e refluxos
provocados pelos movimentos da formação de nosso estado nacional.
Em todo o período colonial, em especial, mas também durante os dois
impérios, as comunidades locais conheciam relativa autonomia
oriunda principalmente das distâncias que as separavam da sede
colonial e da metrópole e das dificuldades de comunicação com as
mesmas. Assim, as vilas, cidades e províncias eram obrigadas a se
organizar para resolver a maioria de seus problemas dentro de seus
próprios limites. Apesar da centralização formal e burocrática do
Estado nos poderes do rei ou dos imperadores, a presença real do
poder principal era esporádica e intermitente.
Já perto da virada do século a centralização conheceu um período de
maior força com a fundação da República, em 1889. Mesmo assim, como
a chamada Primeira República se fundamentava sobre o poder
oligárquico regional ou estadual, a descentralização continuou
existindo na práxis política. Apesar de haver diretrizes nacionais
definidas pelo Executivo e Legislativo centrais, prevalecia uma
fragmentação do poder que favorecia uma certa independência
regional. As demandas e interesses locais muitas vezes se
sobrepunham às orientações vindas da sede. Essa configuração se
manteve e se fortaleceu durante cinquenta anos e só se modificou
com o advento da Revolução de 1930, que tinha justamente por
objetivo e motivação se contrapor a ela.
A chegada de Getúlio Vargas ao poder ocorreu num processo em que se
buscava romper as origens oligárquicas do Estado brasileiro e
promover uma centralização capaz de lhe dar condições para
alavancar a industrialização nacional. Um ato simbólico que
consegue dar a dimensão do que os revolucionários de 1930 queriam
fazer e fizeram foi a queima das bandeiras dos estados,
significando o surgimento de um verdadeiro Estado nacional, que a
partir do golpe de 1937 assumiu um modelo influenciado pelo
fascismo. Apesar de a quebra do poder oligárquico não ter sido
completa, Vargas conseguiu restringi-lo a seus limites territoriais
e implantou, pela primeira vez na história brasileira, a
subordinação real de estados e municípios à vontade da sede da
federação.
Com a saída de Vargas da presidência da República e o fim de seu
Estado Novo, em 1945, inicia-se a democratização do país, o que
permitiu o ressurgimento dos municípios como instâncias de poder
autônomas e atuantes. Essa nova descentralização conhecia, no
entanto, limites bem brasileiros: onde havia uma preponderância de
forças políticas de esquerda ela foi adiada ou mesmo impedida, já
que o poder central estava em total consonância com as diretrizes
americanas da Guerra Fria.
O breve período democrático conheceu seu fim em 1964 com o golpe
militar que instalou a ditadura que duraria pouco mais de vinte
anos. Um novo período de concentração de poderes se iniciou, dessa
vez com uma violência inédita que cassou os direitos políticos de
prefeitos recém-eleitos, impediu a realização de novas eleições e
castrou por completo a autonomia de muitos municípios, sob a
alegação de que estavam em área de segurança nacional. Dentre esses
estava a cidade de Santos, que viveu um longo período sem eleger
seu prefeito por abrigar o principal porto do país e ter uma
tradição de esquerda, a ponto de ser conhecida como Cidade
Vermelha, alimentada principalmente por um forte movimento
sindical, em especial o dos trabalhadores portuários.
O processo de redemocratização do país se desenvolveu ao lado do
crescimento das pressões descentralizantes na busca de retomar o
verdadeiro caráter de federação do Estado brasileiro. Ainda em
1976, quando da primeira vitória eleitoral expressiva das forças
democráticas sobre a ditadura, o movimento municipalista se
reforçou. Naquele ano, a oposição conquistou suas primeiras
prefeituras e começou experiências administrativas de sucesso, como
as de Lajes, no Paraná, e Piracicaba, em São Paulo.
Essa luta pela reconstrução da democracia acabou por desembocar no
Congresso Constituinte que elaborou a nova carta magna do país, em
vigor desde 1988. A nova Constituição procurou responder às
demandas por autonomia política e financeira dos entes da federação
em relação à União e tratou de alterar a perversa distribuição de
receitas entre as instâncias de poder. Muito foi conseguido, apesar
de os municípios brasileiros ainda terem dependência financeira
considerável (ver tabela 1) se compararmos com a situação vivida
por alguns países europeus como a Suécia, onde 67% da arrecadação
pública fica na esfera local.
Aqui cabe um parêntese sobre uma peculiaridade da história
municipalista no Brasil. Mesmo durante os períodos de maior
centralismo o município manteve sua capacidade de tributar, ainda
que mantida dentro de limites estreitos. Essa característica
diferencia o Brasil de muitos países latino-americanos e europeus,
nos quais o poder local não tem arrecadação própria, apesar de ter
receita garantida.
Durante a reconstrução democrática, novos atores políticos e
sociais surgiram e se consolidaram como interlocutores do Estado e
representantes da sociedade. Os movimentos sociais, em especial os
urbanos, como o sindical e os por moradia, passaram a exigir o
apoio das autoridades locais para a realização de suas lutas. Esse
ambiente ajudou a reforçar a tendência descentralizadora que se
consubstanciou na Constituição de 1988.
Hoje, do ponto de vista legal, os municípios brasileiros gerenciam
diversas áreas da atuação do Estado. É assim com a saúde e a
educação básica, nas quais o governo federal tem o papel apenas de
desenhar as diretrizes gerais. É o município quem deve suprir as
necessidades da população nesses e em outros serviços tipicamente
urbanos, como coleta e destinação de resíduos e lixo, atividades
culturais, esportivas e de lazer.
No entanto, no que tange à habitação popular, os municípios ainda
não têm como regra uma presença ativa na construção de moradias,
embora possam legislar sobre o tema. Ainda há uma dependência
grande em relação aos estados e à União, principalmente por causa
das linhas de financiamento e por falta de vontade política dos
chefes dos executivos municipais de reservar uma parte de seus
orçamentos para habitação. Cidades que têm suas próprias políticas
habitacionais, como Santos, ainda são exceções.
Por fim, nessa definição de nosso conceito de poder local, cabe
ressaltar uma cararacterística brasileira desse processo de
descentralização. Em nosso país não existe um vínculo necessário
entre a municipalização e políticas neoliberais de busca de
qualquer variante de um Estado mínimo. Pelo contrário, como esse
movimento funcionou como um dos motores da democratização do país,
o que sua vertente progressista busca é um Estado desprivatizado e
capaz de agir para disciplinar as forças do mercado no âmbito
municipal.
Levando-se em conta que o Brasil sustenta uma imensa desigualdade
social, com uma concentração de renda quase sem similares no mundo,
devemos considerar que a uma enorme parcela da população não são
dadas possibilidades de acesso ao mercado imobiliário. O processo
de fragilização das relações de trabalho, em curso no mundo e
acirrado em nosso país com a chegada ao poder do atual governo
federal, só tem agravado essa realidade.
Cada vez mais os trabalhadores, mesmo tendo mantido seus empregos,
não conseguem atingir um nível de renda suficiente para adquirir ou
construir um imóvel. Também é crescente o número de pessoas
desempregadas ou jogadas no chamado mercado informal, geralmente um
eufemismo para subemprego ou mesmo para trabalho semi-escravo. Com
isso é crescente também a demanda por habitação. No Brasil como um
todo, para as faixas de população mais carentes, com renda familiar
de até 300 dólares/mês, a demanda habitacional é superior a 10
milhões de unidades, sendo necessárias cerca de 15 milhões de novas
habitações até o ano 2000.
A produção da imensa maioria das habitações ocupadas pelas faixas
da população de baixa renda, até este momento, tem ocorrido através
da iniciativa direta dos próprios usuários. Particularmente as
famílias com renda mensal inferior a 100 dólares/mês, via de regra,
têm acesso a moradias precárias através da produção espontânea
(auto-ajuda ou ajuda-mútua) ou de programas especiais nos quais
está presente algum tipo de subsídio oficial, utilizando-se em
ambos os casos, as chamadas habitações evolutivas, onde o usuário
encarrega-se de finalizar a moradia de acordo com suas
possibilidades financeiras.
Portanto, quando falamos em habitação popular estamos nos referindo
a políticas e ações do poder público para assegurar a esse segmento
acesso a moradias adequadas. Isso só pode se dar se não houver
vinculação com a lógica do mercado que em geral ignora as
necessidades dessa população excluída e também se o poder público
oferecer financiamentos e subsídios.
Incluimos ainda em nosso conceito de habitação popular o
oferecimento de acesso aos serviços urbanos a essas pessoas de tal
maneira a assegurar-lhes condições de vida saudáveis e dignas,
transformando-os em verdadeiros cidadãos. Sem esse pressuposto, a
moradia fica resumida à garantia de um teto para que essa população
possa se reproduzir, mantendo, no entanto, as mesmas condições de
exclusão e miséria em que se encontram.
O primeiro passo para a atacar de frente o problema da falta de
moradia na cidade de Santos foi a criação das bases legais para a
intervenção do poder público na questão. Em 15 de maio de 1992, foi
aprovada a Lei Complementar n. 53, a Lei das ZEIS (Zonas Especiais
de Interesse Social), parte integrante do Plano Diretor da cidade
e efetivamente implantada no ano seguinte. Essa legislação tem sua
fundamentação na Constituição que determina, em seu artigo quinto,
que a propriedade privada deve ter função social e, no artigo 182,
que essa função social será cumprida quando atender às exigências
fundamentais da ordenação da cidade expressas no plano diretor.
É importante observar que, além de viabilizar a Reforma Urbana
também preconizada pela Constituição, a legislação de ZEIS aprovada
em Santos desenvolveu critérios específicos para uso e ocupação do
solo, rompendo uma série de limites que dificultavam a iniciativa
de famílias, comunidades e empresários no tocante à produção de
habitações regulares e a um custo menor.
São três os tipos de ZEIS:
ZEIS 1: Áreas ocupadas por população de baixa renda (favelas, em
geral), onde há interesse e condições para promover-se a
regularização fundiária, implantar-se melhorias urbanas (saneamento
básico, água, luz, etc.) e construir-se habitação e equipamentos
sociais (escolas, guarderías, postos de saúde, etc.). As tipologias
físicas pré-existentes nas áreas de ZEIS 1 são extremamente
desfavoráveis, configurando situações dramáticas se levados em
conta os riscos de vida, as péssimas condições de saneamento e
aspectos ligados a saúde pública.
São áreas localizadas nos morros (cierros) e principalmente na Zona
Noroeste de Santos, esta última uma região baixa, ao nível do mar,
onde são numerosas as palafitas, casas precárias feitas de madeira
e materiais muitas vezes provenientes do lixo, construídas sobre
áreas inundáveis ou sobre braços de mar.
As obras envolvem desde a estabilização de encostas, no caso dos
morros, até grandes massas de aterro em algumas áreas alagadas.
Invariavelmente, as intervenções sempre prevêm a dotação de infra-estrutura (saneamento básico, drenagem, água e eletricidade), com
a posterior regularização da posse da terra.
Atualmente, são cerca de 6.200 famílias sendo atendidas, segundo
demonstra o quadro a seguir:
A execução das habitações dá-se com a participação parcial ou total
da administração municipal, havendo três tipos de soluções:
ESTÁGIO DE INTERVENÇAO | |||
PROJETO | NO DE FAMÍLIAS | URBANIZAÇAO | REGULARIZAÇAO |
Dique | 2.808 | 1a e 2a fases - 1220 fam. | em andamento |
Vila Alemoa | 1.000 | 500 famílias | em andamento |
Vila Progresso | 874 | em projeto | cadastramento |
Vila Santa Casa | 156 | em execução | terreno adquirido PMS |
Vila José Menino | 287 | concluída | concluída |
Torquato Dias | 146 | em projeto | em andamento |
Lomba da Penha | 80 | em projeto | em andamento |
Caneleira III | 400 | em execução | em andamento |
Vila Telma | 111 | concluída | em andamento |
Estuário | 88 | em execução | em andamento |
Vila Redenção | 15 | em projeto | em andamento |
Vila Pantanal | 183 | em execução | em andamento |
N.Sra. de Fátima | 80 | em projeto | em andamento |
TOTAL | 6.228 |
A intervenção nessas áreas caracteriza-se pela implantação e
entrega de lotes urbanizados para posterior execução das unidades
habitacionais em regime de auto-construção to-ajuda e ajuda-mútua
beneficiando os integrantes de movimentos populares de luta por
moradia. Por outro lado, ao promover a simplificação das regras
relativas aos parâmetros urbanísticos e de edificação, a través da
lei de ZEIS, o poder local incentiva também a produção de lotes ou
conjuntos habitacionais pela iniciativa privada e associações
comunitárias.
A possibilidade de um maior adensamento das soluções habitacionais
nestas áreas, quando comparadas com as estabelecidas pelo
zoneamento para o restante da cidade, torna possível uma redução
nos custos de infra-estrutura.
Nas questões ligadas ao desenho urbano, a legislação aplicável nas
ZEIS do tipo 2, remete a um repertório de soluções atualmente
abandonado, do qual fazem parte as antigas Vilas Operárias do
início do século, as casas sobrepostas e os condomínios
horizontais.
ZEIS 3: Áreas deterioradas formadas por edifícios urbanos ocupados,
como cortiços (casas de vencidad), onde existam condições
favoráveis e interesse social em promover projetos habitacionais,
seja através de reforma ou construção nova, priorizando aqueles
habitantes que já vivem no local. A locação social é a principal
forma de acesso à moradia prevista para as ZEIS do tipo 3. O
aluguel social, na grande parte dos casos, incorpora um subsídio
oficial, na medida em que a demanda é constituída por famílias
extremamente carentes.
Ao contrário de experiências semelhantes ocorridas em outros
países, particularmente na França, neste caso não se trata de
famílias com perspectivas de ascensão social a curto prazo, o que
tornaria a locação social uma espécie de estágio intermediário
antes de se alcançar a casa própria ou a possibilidade de pagar o
aluguel de mercado. Os mecanismos financeiros criados para
manutenção de programas deste tipo em países desenvolvidos
dificilmente poderiam servir de modelo para a sua implantação em
cidades do Terceiro Mundo.
Vários imóveis antigos localizados no Centro Histórico de Santos
encontram-se em fase de recuperação e reabilitação para fins de
locação social. Nestes imóveis, alguns deles ex-cortiços, residirão
cerca de 100 famílias, dando início a um dos programas pioneiros
deste gênero no Brasil.
2) A participação popular garantida por lei é fundamental para o
sucesso da política habitaconal do município.
Em Santos, a participação popular começou já no processo de
discussão e elaboração da legislação que fundamenta a nossa
política habitacional. Nesse processo foram ouvidos e tiveram ampla
participação desde os movimentos por moradia até os agentes formais
da produção imobiliária na cidade.
Um dos instrumentos legais que asseguram a participação popular é
a necessidade de que todas as ZEIS do tipo 1 tenham uma Comissão de
Urbanização e Legalização (Comul), nas quais têm representação o
executivo municipal, o legislativo e entidades civis. Cabe à Comul,
sobretudo, acompanhar e fiscalizar a elaboraçào e implantação do
Plano de Urbanização e Regularização Jurídica na respectiva área.
O Conselho Municipal de Habitação, também criado por lei, e formado
por representantes da população, da sociedade civil organizada e do
poder público, é outra garantia de participação popular. Ele tem
como objetivo aprovar, supervisionar e gerar normas e diretrizes
para a aplicação dos programas habitacionais do município. A cada
dois anos acontece a Conferência Municipal de Habitação, quando se
definem os pontos que direcionarão o funcionamento do conselho pelo
período seguinte.
A primeira dessas conferências aconteceu em 1993 e se caracterizou
por uma preponderância de reivindicações e projetos. No ano
passado, com a participação de mais de mil pessoas, foi realizada
a segunda conferência, que demonstrou o amadurecimento do conselho
e das relações entre a população, os movimentos organizados, a
sociedade civil e o poder público.
3) O orçamento municipal deve garantir destinação de recursos aos
programas habitacionais.
No caso santista, o orçamento municipal destina 5% aos projetos de
habitação popular. Essa destinação se dá através do Fundo de
Incentivo à Construção de Habitação Popular (Fincohap),
constituído de recursos do orçamento do município, mas que pode
receber verbas de terceiros, bem como dos governos federal e
estadual. Em razão de sua finalidade o Fincohap é um fundo
rotativo, ou seja, recebe recursos, financia projetos e recebe
prestações dos beneficiários finais-aqueles que já receberam suas
casas. Ao retornar, o dinheiro das prestações é utilizado para o
financiamento de novos projetos. O poder público municipal dá
sustentação ao fundo suprindo omissões dos governos federal e
estadual. Para este ano estimamos em mais de US$ 10 milhões no
setor. Essa destinação de recursos permitirá que ao término do
atual mandato, o déficit habitacional da cidade, hoje estimando em
dez mil moradias, tenha sido reduzido em cerca de 50%.
4) O município deve se articular com as forças políticas e sociais
locais para pressionar outras esferas de governo para que estes
definam diretrizes para a habitaçào popular e aloquem recursos que
se somem aos municipais.
O poder local não pode ser considerado uma ilha isolada em relação
às demais instâncias de poder do Estado. pelo contrário, ele deve
ser o indutor e o condutor de demandas da cidade, fazendo-as chegar
aos governantes centrais. Essa atuação política do representante do
poder local é fundamental para a consolidação da sua relação com
apopulação que representa. À frente da prefeitura de Santos, não
nos furtamos de participar do debate político nacional; pelo
contrário, consideramos essa atuação parte fundamental do nosso
papel político, assumido quando fomos eleitos pela população. Com
essa atuação conseguimos, por exemplo, que o governo federal se
comprometesse a financiar parte do nosso principal projeto
habitacional, a urbanização da favela sobre palafitas do Dique da
Vila Gilda.
5) A política habitacional deve priorizar a fixação das populações
nos locais onde elas já residam.
Devemos a todo custo evitar a transferência de grandes massas
populacionais dos locais que já ocupam, evitando assim afastá-las
dos seus locais de trabalho. Essa tese só não pode ser seguida
quando as moradias existentes ocuparem áreas de risco, como é o
caso de parcela da população que habita áreas dos morros santistas,
que apesar do alto custo financeiro e humano, devem ser retiradas
desses locais.
Essa tese se justifica pela consciência que temos da necessidade de
se evitar a criação de novas demandas por serviços públicos, como
saneamento básico e transportes, por exemplo. A nossa política
habitacional entende que a escolha dos locais de moradia pelas
populações se dá muitas vezes pela proximidade com o trabalho.
Removê-las irá provocar uma diminuição de sua renda, já que
passarão a gastar mais com transporte. Em Santos, trabalhamos com
o conceito do não-transporte, ou seja, evitamos criar a necessidade
de locomoção diária entre casa, lazer e trabalho.
A partir dessa consciência é que desenvolvemos o projeto de locação
social, que procura oferecer condições de habitabilidade aos
moradores dos cortiços que se concentram principalmente no centro
da cidade, onde também estão as principais fontes de emprego das
populações que residem nessas habitações precárias.
6) A política habitacional deve ser integrada a outras que envolvam
a recuperação de áreas degradadas ambientalmente, que busquem
geração de empregos e oferecimento de serviços públicos, como
saúde, educação, cultura, esporte, lazer, etc.
Em Santos sempre procuramos combinar a intervenção na área da
habitação com outras ações que também garantam não só uma moradia
digna, mas também condições de habitabilidade que dependam do
oferecimento de serviços públicos acessíveis e um ambiente
saudável.
Um exemplo de intervenção que também age no campo ambiental é a
urbanização da favela sobre palafitas do Dique da Vila Gilda. Nesse
local, além de construirmos moradias de alvenaria em substituição
aos barracos, realizamos a canalização de um braço de mar, o
chamado Rio do Bugre, e criamos um sistema de saneamento básico que
irá recuperar as condições de balneabilidade do curso d'água.
Também foi criada uma rede de serviços públicos com vistas a
atender a população local, antes obrigada a se deslocar para outras
áreas para ter atendimento médico ou escolas.
7) A política habitacional não pode se submeter à lógica do
mercado, de segmentação dos espaços urbanos, e deve evitar a
formação de guetos sociais.
Uma política habitacional que tenha como um de seus nortes o desejo
de favorecer o desenvolvimento social não pode se curvar à lógica
de que populações de diferentes níveis de renda devem
necessariamente ocupar espaços físicos diferentes. Não compactuamos
com a política vigente em nosso país durante a década de 70 e boa
parte do decênio seguinte que apregoava a construção de bairros
populares distantes dos centros urbanos. Essa idéia era
interessante para a especulação imobiliária, que se beneficiava com
o aproveitamento das zonas intermediárias entre os centros e os
distantes bairros operários e populares. Acreditamos que seja
salutar para o desenvolvimento da sociedade a convivência entre os
diferentes extratos sociais. Isso e a experiência de superação dos
conflitos fortalece a democracia e a idéia de igualdade entre os
homens.
Gostaríamos de finalizar ressaltando que a solução para os
problemas habitacionais de nossas populações excluídas está ao
alcance da mão, bastando para atingi-los a vontade política de
estender os braços alternando punhos fechados e abertos conforme os
momentos de luta e de acolhimento.
Fecha de referencia: 30-04-1997
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